segunda-feira, março 27, 2006

3 minutos antes da maré encher

Que poderiam fazer os A Naifa após o sucesso de Canções Subterrâneas? Continuar, pois claro. O problema é que, da sucessão de um disco que veio revolucionar espera-se sempre algo novo. Não é, de facto, o caso. Ainda bem. Em Canções Subterrâneas, obtemos uma mistela muito agradável entre a Pop, o Trip-hop, a Electrónica e, chave-mestra de todo o conjunto, o Fado. Em 3 minutos antes da maré encher, idem aspas. A diferença é que estamos perante um género / sub-género / mistura de géneros (riscar o que lhe parecer menos apropriado) que, não sendo virgem, é orfã de projectos de qualidade.
No seu primeiro trabalho os A Naifa conseguiram espantar o mundo crítico português. É possível fazer Fado-Electrónico com qualidade, com uma identidade própria, sem samplar Amália com uma batida de duvidosa novidade. E fizeram-no com uma força e um ímpeto que a necessidade de serem ouvidos exigia. Neste segundo disco, estão mais calmos. Os mesmos problemas urbanos estão lá, a mesma fusão de estilos está lá, a não renegação do Fado como ponto de partida está lá, mas já não é preciso tanta efusividade. Eles já sabem ser ouvidos. Há que dar voz, então, à palavra.
Pegando no título de um livro de Valter Hugo Mãe, em 3 minutos antes da maré encher, sucedem-se poemas de jovens poetas portugueses como Adília Lopes, José Luis Peixoto ou Rui Lage, num alinhamento coerente, não muito arriscado, jogando pela certa, onde a componente Fado tanto é dada pela voz de Mitó, como pelas ambientais guitarras portuguesas. Em relação ao primeiro trabalho, um pouco mais de relevo para o Trip-hop. De resto, prioridade à palavra. Quem canta "Tenho uma estátua florescente da virgem maria." só o pode fazer.
Contra os A Naifa, um dos mais acertados e benvindos projectos no que toca ao tratamento do Fado, joga a especificidade da sua música. Muito centrada nesse mesmo tratamento ao Fado, e num público maioritariamente citadino, numa faixa etária muito trintona. Apesar disso, ficam bons registos como "Da uma da noite às duas da manhã", "Fé", "Senoritas" ou "A verdade apanha-se com enganos". Em imagem, o cartaz que anuncia as datas do seus concertos.
Título: 3 minutos antes da maré encher
Autor: A Naifa
Nota: 7/10